segunda-feira, 26 de abril de 2010

Pássaros, Perfumes e uma Mercedes Benz

Quanto eu tinha de 10 para 11 anos, isso lá em 1985, estudava com mais 3 garotos; éramos conhecidos como “Os Baixinhos”. Já falei sobre eles num post anterior: O Tata, os Gêmeos e eu.
Nunca cabulamos nem uma aula sequer, muito dificilmente algum de nós faltava. O nosso negócio era bagunçar dentro da escola mesmo.
Tinha um quinto cara que estudava com a gente que era todo estiloso - infelizmente não estou conseguindo me lembrar do nome dele agora. Ele era o único que tinha um irmão mais velho. Portanto era ele quem trazia as novidades pra gente: uma roupa diferente, uma gíria nova, um som bacana.

Acho que nunca conheci esse cara pessoalmente, - dizem que ele chegou a namorar naquela época a cantora Rosana - 'Como Uma Deusa', lembram? - mas ele me apresentou, através do irmão dele, duas coisas que foram importantes e fundamentais para a minha formação: Foi a primeira vez que ouvi o “Rock sujo”, como Janis, Doors, Pink Floyd e outras coisas do tipo, umas que nunca mais ouvi e que não tenho a menor ideia de o que eram. Foi também a minha primeira experiência com as 'drogas', que se resumiam a um lança-perfume e a cola, o primeiro com uma certa frequencia desde o começo. A maconha, minha terceira droga, veio muitos anos depois.
Quando nosso amigo não ia pra escola – esse sim faltava muito – ou quando não conseguia arrumar o 'lança', íamos a uma casa de material de construção e ficávamos cheirando Cola Tigre. Ridículo!
Todos diziam que dava barato, mas tenho certeza que ficávamos apenas com uma puta dor de cabeça, mas não tínhamos coragem de assumir.
Algumas vezes a gente molhava as mangas do uniforme e ficávamos zonzos. Minutos depois estávamos na sala de aula fazendo a bagunça costumeira: guerra de papeis, pedaços de borracha soprados pelo caninho da caneta e algumas afrontas contra um ou outro professor. No recreio a já tradicional guerra de ovos cozidos. Acho que conheci, no máximo, 10 pessoas que realmente comiam os ovos. Eles não eram servidos pra isso.
A maioria da escola sabia, até porque não tínhamos a intenção nem a capacidade de esconder de ninguém. Na verdade, gostávamos de ver as pessoas nos olhando, umas com cara de admiração, outras com medo e outras com indiferença. O que nos importava era chamar a atenção. Porém ninguém nunca nos falou nada sobre isso.
Lembro-me que uma vez, durante uma prova, eu estava tão fora do normal que eu havia entrado na sala com a manga ensopada, cheirei na frente de todos e me levantei umas duas vezes pra conferir com um aluno se a resposta dele estava correta, pois a minha eu sabia que estava. A professora, talvez assustada ou apenas indiferente com mais um 'futuro delinquente', não fez absolutamente nada.
O Tata e eu éramos os mais inteligentes da nossa turminha. Tirávamos boas notas e nos dávamos bem com todos da escola. Hoje não sei dizer o que aconteceu com nenhum deles. Perdemos totalmente o contato.
Num determinado momento daquele ano letivo, surgiu a brincadeira de desenhar pintos na cadeira dos outros, ou 'passaralhos', pois era mais engraçado ainda quando alguém sentava sobre um pinto com asas. - Ah, que saudade dos tempos que eu ria de coisas como essa!
Eu confesso que já havia feito um ou dois desenhos. Mas havia entre nós um acordo de nunca fazermos desenho em carteiras perto das nossas pois - obviamente - nunca desconfiariam de alguém do outro lado da sala, certo?
Porém, havia na nossa classe um menino, cara de bobo, jeito de bobo, totalmente bobo que se sentava atrás de uma menina chata, cara de chata, jeito de chata, totalmente chata, metida à besta com seu narizinho empinado. Eu me sentava bem ao lado desse garoto. E ele, tão imbecil quanto todos nós, também fez o desenho do pinto voador, mas o fez na cadeira da chatinha, que por alguma razão não estava na sala. Ele, rindo - e quando ria ficava com mais cara de bobo ainda - disse para eu ver o que ele havia feito.
Por alguma estúpida razão, eu me abaixei, ainda segurando o meu lápis que usava para alguma atividade, fui ver de perto a 'obra-prima'.
Exatamente nesse momento, a garota entra na sala; nossos olhares se cruzam, ela se aproxima, não consigo disfarçar, ela olha para a cadeira, para minha mão trêmula segurando o lápis preto e no mesmo instante chama a professora para ver o que EU havia feito.
Falei que não havia sido eu. Chorei, jurei por Deus, pelos meus pais. Mas de nada
adiantou. Fui mandado pra diretoria.
Se houve algo 'nobre' foi que eu não entreguei o imbecil que fez o desenho, porque senão a coisa poderia ser pior, eu viraria o 'dedo-duro' e isso seria pior ainda.
Então, na verdade, foi mais uma questão de sobrevivência e também - por que não admitir - aquele velho desejo de chocar e chamar a atenção.
Minha mãe foi chamada. Ouvi um sermão, Tomei advertência, um dia de suspensão e umas chineladas quando cheguei em casa.
Condenei a todos. Eles foram injustos comigo. Não acreditaram em mim. Minha palavra naquele momento deveria ser considerada mais do que o que as provas que eles tinham. E eu achava que meu histórico não deveria ser usado naquele caso.
Mas com isso aprendi a tentar ser sincero sempre, para ter a humildade de reconhecer meus erros e a determinação de me defender quando houver necessidade.
Tenho conseguido os dois na maioria das vezes, mas ainda tenho - e sempre terei - essa maldita fome de atenção e um passado que pra sempre irá me condenar, não importa o que eu faça.

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