Todo início de ano, como muita gente faz, paro alguns instantes e tento analisar tudo o que vivi e ver as mudanças naturais pelas quais passei. Ontem não foi diferente. Percebi o quanto tenho admirado mais o meu canto, o quanto tenho valorizado meus momentos a sós. E, voltando mais no tempo, me lembrei de 1987.
1987 foi um ano tumultuado para mim: as companhias, as drogas, a fase rebelde dos 13 anos de idade. Nos estudos eu ia de mal a pior. Foi a primeira sétima série 'braba'. O ano que viciei em cabular aula.
Foi nessa época que conheci meu irmão gêmeo. Era meados de maio, alguns dias depois da morte da minha avó. A primeira pessoa próxima que eu perdia.
Ele se chamava Alexandre, eu acho. Nós éramos fisicamente idênticos, e tínhamos muitas coisas em comum. Talvez nos sentíssemos mais adultos que os demais meninos da turma. Mas ele era diferente, mais intenso, mais “vivido”.
Já com aquela idade ele curtia a solidão de uma forma adulta, que talvez eu só tenha uma compreensão melhor agora.
Sofria de ataques repentinos de fúria. Presenciei umas duas ou três vezes ele brincando com os amigos e, de repente, do nada, ele caía no chão, se debatia, rolava de um lado para o outro. Chorava baixinho. Nenhum moleque se atrevia a tentar levantá-lo. Ficávamos todos paralisados, assustados. Logo em seguida ele ficava de pé, secava as lágrimas do rosto, se limpava e voltava a brincar como se nada tivesse acontecido.
Nunca falamos sobre isso. Não tive coragem de perguntar e ele parecia não se lembrar desses momentos.
Era um ótimo cartomante, e também grande mentiroso. Não sabia dar más notícias; minha mãe e suas amigas adoravam consultá-lo. Talvez nem o levassem a sério, mas certamente gostavam de ouvir que seus maridos chegavam tarde por causa do trabalho ou que estavam realmente no bar com os amigos, mesmo sabendo que isso não era verdade.
A gente se encontrava de vez em quando. Na verdade, eu sabia mais dele através dos nossos amigos em comum.
Nossos encontros foram escasseando e finalmente, em dezembro, ele partiu.
Não houve adeus, não houve até logo.
Foi embora e nunca mais voltou.
Acho muito estranho o fato de ter ficado mais de 20 anos sem pensar nele.
Espero que ele esteja bem.
sexta-feira, 2 de janeiro de 2009
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